Gustavo sabe que é Gustavo desde os sete anos. Agora, aos 12, vai ver no papel o que enxerga todo dia no espelho há quase metade da vida. É uma pessoa trans desde a primeira infância e daqui pra frente vai ser assim reconhecido graças à atuação da Defensoria Pública do Ceará (DPCE), que garantiu na justiça o direito dele de ter a certidão de nascimento alterada e em conformidade com o nome e gênero com os quais identifica-se.
Nascido no Crato, cidade do Cariri cearense, ele revelou há cinco anos à família que se enxerga menino. Como, por lei, não há impedimento de menores de 18 anos retificarem o documento, mas sim a obrigatoriedade do aval dos pais e de uma decisão judicial favorável, foi necessário buscar o poder judiciário – que autorizou a mudança junto ao cartório após pedido da Defensoria.
“Para mim, isso é muito importante porque agora eu não vou mais passar por muitas coisas, como por exemplo a chamada na escola [quando se referem a ele pelo nome de nascimento, feminino]. Meus amigos e familiares sempre me apoiaram em tudo. Todos ficaram muito felizes com a minha conquista”, relata Gustavo.
Ele recebeu a nova certidão na última sexta-feira (26/4), em momento surpresa preparado pela família. A mãe dele, Amanda Alencar, recorda que o filho escreveu, anos atrás, um bilhete no qual revelava, nos dizeres de uma criança, não estar bem por ser identificado pelo gênero feminino e, por isso, queria mudar para se sentir melhor. Começou, então, a não usar mais roupas femininas, cortou o cabelo e assumiu a identidade.
Ela classifica como “muito importante” o garoto ter se encontrado consigo mesmo. “Nunca tive preconceito com nada e nem ninguém. Eu e o pai dele sempre apoiamos e vamos continuar apoiando. Ele hoje vive bem. Não tem mais crises de ansiedade, não passa mal nos lugares por conta do constrangimento. Já fui muito julgada por conta disso, mas sempre busquei o melhor para o meu filho”, afirma.
Supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC) da DPCE, a defensora Mariana Lobo atuou no caso. “A Constituição Federal garante que a identidade de gênero é um direito fundamental e que para ela ser legitimada basta a autodeclaração. A possibilidade de você ter nos seus documentos refletidos o gênero com o qual você se identifica é uma questão de dignidade”, argumenta.
Já o assessor de políticas LGBTs da Prefeitura do Crato, André Lacerda Barros Filho, participou do caso como uma das testemunhas ouvidas pelo juiz. “A retificação é muito importante, principalmente para evitar constrangimentos pelo uso de um nome que não se refere à identidade do gênero da pessoa. Participar desse momento foi algo muito significativo, porque você constrói e fortalece as políticas públicas para uma população que já é tão vulnerável, além de garantir o direito dela de existir no mundo”.
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