"Olhando para a natureza e aprendendo com ela, conseguimos resolver tudo na vida" é um dos lemas de Francier Simião, doutorando na área de Agroecologia e ex-aluno do ensino técnico e da pós-graduação do campus de Crato. Com essa filosofia, ele criou um sistema inovador de tratamento para reúso de água cinza. O projeto é uma parceria entre o campus de Crato do IFCE e a Associação Cristã de Base.
Batizado de "Olho D'água Cinza", o sistema piloto foi implantado na propriedade de Seu Batista e Dona Socorro na Serra da Minguiriba, zona rural do Crato, na Chapada do Araripe. Lá, a água tratada pela tecnologia é reaproveitada na agricultura familiar e para consumo de animais domésticos e silvestres.
No sistema, a água cinza - resultante do uso doméstico - é coletada por um reservatório, onde resíduos com menor densidade flutuam e permanecem, enquanto a água segue o fluxo no sistema. Em seguida, ela passa pela primeira filtragem, inspirada em outra tecnologia social. Há ainda mais dois tanques de filtragem física e biológica, idealizados por Simião, que geram o "olho d'água" cinza, antes da água chegar ao depósito final.
"Há várias tecnologias que trabalham o reúso da água, mas algumas não atendem à necessidade de matar a sede dos animais. Esse sistema segue a dinâmica do ciclo hidrológico no topo da Chapada: a água da chuva infiltra no solo e aflora mais filtrada e limpa ao final, em fontes, nascentes e olhos d'água. É uma proposta de quem sonha em melhorar a vida no semiárido", explica Simião. A água que brota nos "olhos d'água cinza", rodeados por plantas, atrai abelhas e animais silvestres.
Seu Batista conta que a água comprada de carros pipa, para o consumo humano, não é suficiente para a agricultura e para os animais. Com o protótipo, o problema foi resolvido: "Se cada casa aqui pudesse ter o sistema, virava o céu. Nosso problema é a falta de água, e com o reúso as condições melhoram".
O professor Gauberto Barros, orientador de Simião na especialização em Manejo Sustentável da Irrigação para o Desenvolvimento de Sistemas Agrícolas e coordenador da parceria no IFCE, explica que o projeto, que contou com a participação de estudantes do campus, já é objeto de outras pesquisas e deve ser utilizado para aulas de campo.
Com financiamento do Banco do Nordeste, o sistema está sendo implantado em quatro municípios pernambucanos: Bodocó, Ipubi, Araripina e Exu. A ideia é que a tecnologia seja consorciada a um sistema agroflorestal, de acordo com as necessidades de cada agricultor beneficiado. A expectativa do coordenador do projeto na Associação Cristã de Base, Eri Cláudio Alves, é fortalecer o trabalho realizado no estado: "É uma região em que estamos iniciando o trabalho da ACB. Nossa instituição tem sido mais no Cariri cearense e agora estamos expandindo para o sertão de Pernambuco".
Na última quinta-feira (28), representantes do IFCE, da ACB, do Banco do Nordeste e de associações de agricultores de Araripina se reuniram na propriedade de Seu Batista e de Dona Socorro para uma demonstração sobre o sistema. "Acredito que esse projeto chegando à nossa comunidade vai nos beneficiar bastante. Ele serve para tudo e seu uso vai depender do agricultor. Pra mim, é uma maravilha", conta Vilma Gonçalves, da Associação de Produtores Rurais de Serrinha do Aperto, no município de Araripina.
A coordenadora de extensão do campus de Crato do IFCE, que também estava presente no encontro, destacou a importância do projeto: "O projeto é de grande relevância para as comunidades locais da Chapada do Araripe e tem grande poder de impacto acadêmico e profissional. Também é uma satisfação para o IFCE Campus Crato saber do percurso exitoso dos seus egressos tanto do Ensino médio como das graduações e Pós graduações, como é o caso do autor do projeto".