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(Foto: Carlos Marlon) |
Viajar de Fortaleza a Juazeiro do Norte
tornou-se tarefa das mais complicadas após o cancelamento dos voos entre as
duas cidades desde abril. Sem a opção aérea, quem não pode esperar ou pagar uma
viagem particular, precisa se preparar para uma jornada longa, poeirenta e
arriscada de carro ou de ônibus por estradas esburacadas e sem sinalização. O
resultado são percursos demorados e que, quase sempre, causam prejuízos
materiais aos motoristas. A Avianca, empresa que operava o trecho, enfrenta um
processo de recuperação judicial. Outra companhia aérea, a Azul, só vai
disponibilizar voos em junho; e a Gol, que também anunciou a retomada dos voos
entre a Capital e o Cariri, ainda não tem data de início do serviço.
A reportagem viajou
de Fortaleza a Juazeiro do Norte de carro, e fez o trecho oposto de ônibus. O
percurso permitiu ver de perto a situação das rodovias, de um ponto a outro do
Estado, e entender o que vivencia a população que faz o trajeto. Motoristas
relatam que, com a buraqueira, a viagem demora até três horas a mais do que
antes.
De quem sai da Capital, a opção é a BR-116. E
o motorista não precisa ir muito longe para descobrir o tamanho do problema que
tem pela frente. Os primeiros buracos surgem em Pacajus. Há apenas uma faixa em
cada sentido e um fluxo intenso de veículos pesados. Logo, Ademir Dias,
catarinense, caminhoneiro há 34 anos, vem até a nossa equipe para desabafar.
"Aqui,
no Ceará, é o pior lugar que tem", afirma o motorista, que faz o percurso
entre Santa Catarina e Fortaleza de 10 em 10 dias. "Começa a melhorar da
Bahia pra lá".
Segundo
ele, na região Sul do País, a despesa com pedágio é alta, mas compensa.
"Eu gasto, lá pra baixo, de pedágio, 2 mil reais por mês. Só que vale a
pena. A gente anda em estrada boa e não quebra o caminhão", explica.
"Se você passar num buraco é capaz de tombar a carga", diz ele. O
caminhoneiro também reclama da insegurança. "É assalto direto que
acontece".
De
Pacajus, os problemas seguem pela BR-116 até Chorozinho. E pioram. No
entroncamento da chamada "Estrada do Algodão", pegar a contramão para
fugir das crateras virou rotina. Motoristas encontram não só buracos, poeira,
trechos sem acostamento, mas, também, dezenas de tapadores de buraco
improvisados. Homens da região, que passam o dia colocando areia nas crateras
em troca de moedas e cédulas que são jogadas ao vento.
Aparecendo
"A
gente sempre está aí, aparecendo nos buracos" é a explicação de Rafael
Silva, de 19 anos. Alguns deles vêm de outros municípios, como Cascavel. A
renda varia de R$ 30 a R$ 50 por dia. Chegam cedo, 6 da manhã, e ficam até o
início da noite. "É o único ganha-pão nosso", afirma Antônio Barbosa,
39 anos. Ainda assim, ele faz questão de dizer que estão fechando os buracos,
"mas não era para isso acontecer". A responsabilidade é de outras
pessoas.
Os
buracos diminuem, mas não desaparecem entre Chorozinho e Russas e, assim, em
diversos trechos da BR-116 que seguem até a região do Cariri. Dali, a via ainda
continua até Penaforte, quando entra em Pernambuco, em direção ao Sul do País.
Para quem vai a Juazeiro do Norte, é preciso
prosseguir na rodovia federal até Barro, entrando, depois, na BR-230, na CE-385
e, em seguida, na CE- 060. No total, são 514 quilômetros de estrada.
Para
encurtar o caminho, foi construída a Rodovia Padre Cícero, composta por vários
segmentos federais e estaduais. O motorista que sai da Capital e pega a BR-116
até o município de Chorozinho pode entrar, no sentido Quixadá, pela BR-122. A
proposta é diminuir em 52 quilômetros a distância entre Fortaleza e a terra do
Padre Cícero. Mas, na prática, o que a rodovia encurta em quilômetros, aumenta
em dor de cabeça.
Sequência
Em
Quixadá, o motorista vai enfrentar 40 quilômetros de estrada destruída até o
próximo município, Banabuiú. "Não tem acostamento, muita buraqueira, não
tem sinalização, é muito difícil você ver uma placa", reclama o
caminhoneiro Mardônio Viana. "Tanto é mais cansativo, porque a gente tem
que diminuir o ritmo, quanto aumenta o perigo de assalto", conta.
A advogada Crislaine Barbosa também reclama
dos prejuízos. "É pneu, é manutenção do carro, né? A gente sempre tem que
arcar e custear com isso aí", explica. Para ela, o trecho é a única opção
de trajeto, mesmo com tantos buracos. A alternativa "era por Morada Nova,
só que aumentaria em torno de 180 quilômetros, porque teria que pegar a cidade
de Ibicuitinga. Então, fica inviável", conta.
Atraso
Saindo
de Banabuiú, outro trecho complicado surge no distrito de Cascudo, em Icó, até
o município de Cedro, pela CE-153. Os buracos na região também atrasam a
viagem. "A estrada aí tá horrível, toda esburacada", explica o
aposentado Antônio Francisco. "Quando está chovendo, isso aqui fica cheio
d'água", conta.
O
trecho da rodovia Padre Cícero depois de Cedro, que passa por Lavras da
Mangabeira, Caririaçu e, por fim, Juazeiro do Norte, está bem sinalizado e sem
relevantes problemas estruturais.
Opção de ônibus
A
única empresa que faz o trajeto rodoviário de Juazeiro do Norte a Fortaleza, e
vice-versa, é a Guanabara. São 38 viagens por dia, ida e volta. Uma multidão de
aproximadamente 1.200 pessoas transita, diariamente, entre os dois destinos.
Com o fim da operação aérea da Avianca, houve incremento de quase 19% no número
de viagens e de passageiros nos quatro trajetos possíveis que a empresa
oferece: via BR-116, via Cedro, via Iguatu e via Penaforte.
Nossa
equipe acompanhou o trajeto via Cedro, saindo da região do Cariri rumo a
Fortaleza. Lucimar Fideles, de 73 anos, foi uma das passageiras da longa
jornada. São 12 horas, 18 paradas. Ela estava indo à Capital por questões de
saúde. A filha, que a aguardava em Fortaleza, já tinha avisado: "mamãe,
não tem buraco, tem cratera".
A
aposentada Fátima de Lima viajava com a neta, Rariana Lourenço, de 22 anos. A
idosa explicou que precisava visitar uma irmã na UTI. "A última vez que eu
fui, me senti tonta, com gastura, passei mal dentro do ônibus", contou a
aposentada. "Doze horas, praticamente. Realmente, é bem cansativo",
confirmou a neta.
O
ônibus segue de Juazeiro do Norte para Crato e, depois, para Farias Brito pela
CE-386. A estrada está cheia de remendos. Segundo um usuário que faz
semanalmente o trajeto, mas preferiu não se identificar, o problema é o tipo de
material utilizado no asfalto.
"É de péssima
qualidade. Eles fazem um serviço e, com uma semana, o buraco está aberto
novamente. Pode ver que já está afundado. O serviço foi feito agora, e os
buracos já estão abertos".
Mesma situação pode ser vista no trecho entre
Missão Velha e Barbalha. "Foi feita a duplicação. Só que a obra não foi
nem inaugurada ainda e já está toda remendada. Já tem locais que estão
afundando", reclama o passageiro. "A gente via fila de carro de
passeio com pneu estourado. Quando estoura o pneu, quebra roda, estoura
amortecedor, é prejuízo" afirma.
Bagagens caem
Assim
como quem viaja de carro, a maior reclamação é o trecho entre Banabuiú e
Quixadá, na BR-122. Segundo Manoel Duarte, de 73 anos, que faz o percurso de 15
em 15 dias, o "sacolejo" nesse trecho é tão grande que "as
bagagens caem por cima da gente". "O ônibus não é como o avião. O
avião tem a gavetinha, que tranca. Aqui é solta. Quando o carro solavanca
muito, a mala cai".
Damião
Machado, de 61 anos, teve muito prejuízo. Ele já tinha comprado a viagem de ida
e volta para Juazeiro de avião, pela Avianca. "Esse horário, eu estaria
viajando para São Paulo. Só que a Avianca quebrou, perdi a passagem, aí tive
que comprar uma da Latam, de Fortaleza, pagando mais que o dobro do
preço", revela.
O
trecho final da viagem de ônibus é a BR-116, circulando no mesmo pedaço
poeirento e estreito do início da matéria, o que torna as horas finais da
jornada ainda mais longas.
"É
risco de vida, como já aconteceu aqui, na BR-116. Um caminhoneiro foi desviar
de um buraco, virou o caminhão e morreu", lembra outro passageiro, cansado
e revoltado com o descaso na via.
Quem
sai às 9h30 de Juazeiro, chega na Rodoviária Engenheiro João Tomé por volta das
21h. Hora de recolher as malas, esticar as pernas e deixar o veículo pra trás.
O casal de idosos Antônio Lisboa e Antônia Fernandes estava bem exausto.
"Muito cansativa a viagem. Cansativa demais", diz ele, com seus 71
anos de idade. "Pra gente que já tem a idade, não dá mais não, viu?",
diz ela, com seus 62 anos. Diário do Nordeste
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