Brasília. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acusou, ontem, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de confundir o público com o privado ao utilizar a Advocacia-Geral da União para tentar anular provas recolhidas contra ele dentro da sede do Legislativo, durante as investigações do esquema de corrupção da Petrobras.
Segundo o chefe do Ministério Público Federal, "sob o parco disfarce da defesa de prerrogativa institucional", Cunha pediu que a AGU questionasse no Supremo Tribunal Federal (STF) ação de procuradores que copiaram material do sistema de informática da Câmara.
A operação ocorreu em maio após revelação de que o nome de Cunha aparece como autor dos arquivos onde foram redigidos requerimentos que delatores do esquema dizem comprovar o envolvimento dele com o escândalo de corrupção.
Para Janot, apenas Cunha, que é investigado por suposta ligação com os desvios da estatal, tem interesse na ação da Advocacia-Geral da União.
"O inquérito investiga criminalmente a pessoa de Eduardo Cunha, que tem plenitude de meios para assegurar sua defesa em juízo e, como seria de se esperar, está representado por advogado. O investigado solicitou a intervenção da advocacia pública em seu favor, sob o parco disfarce do discurso da defesa de prerrogativa institucional. O que se tem, então, é um agravo em matéria criminal em que a Câmara dos Deputados figura como recorrente, mas cujo objeto só a Eduardo Cunha interessa".
"O agravo em questão evoca, em pleno século XXI, decantado vício de formação da sociedade brasileira: a confusão do público com o privado", completou Rodrigo Janot. O procurador-geral sustenta que não houve violação da imunidade parlamentar, alegada pela AGU.
"A agravante (AGU) não esclarece como, onde e em que medida o acesso a informações de ordem técnica, referentes aos sistemas informáticos e da casa legislativa e ao trâmite burocrático (objeto da diligência determinada pelo STF), teria violado prerrogativas parlamentares. A invocação a violações 'em abstrato' a imunidades parlamentares esconde o fato de que a agravante, nestes autos representada pela Advocacia-Geral da União, atua no exclusivo interesse particular da defesa de um investigado", aponta Janot.
O procurador-geral citou a discussão pública entre Cunha e o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, sobre quem teria tido a iniciativa da ação para defender que não há interesse da Câmara em jogo, mas apenas do presidente da Casa, que é investigado na Lava-Jato.
"A aparente tentativa do presidente da Câmara de dissociar seu nome do agravo interposto é reflexo direto da repercussão bastante negativa da iniciativa da Advocacia da União. Não é para menos: é óbvio, até para leigos, que a tentativa da Advocacia da União de invalidar provas colhidas no cumprimento da decisão do STF beneficia somente ao parlamentar", disse.
Ameaça
Eduardo Cunha também garantiu, ontem, que não vai aceitar uma alteração de mérito na proposta de mudança da política de desoneração da folha de pagamento e ameaçou recorrer ao STF para assegurar uma nova análise da Casa.
A proposta, último ponto do ajuste fiscal, está no Senado e deve ser apreciada na próxima semana. A intenção de governistas é alterar, por meio de uma emenda de redação, modificações feitas pelos deputados que excluem do pagamento de imposto algumas categorias.
A manobra foi usada na votação do reajuste do salário mínimo e permitiria que a presidente Dilma Rousseff vetasse esse trecho do projeto. O líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), fez a sugestão na reunião com líderes desta quarta (12), mas não houve acordo sobre a mudança.
"A Câmara ingressará no Supremo para determinar liminarmente que venha para a Casa", afirmou o deputado quando questionado sobre a intenção de mudança de Delcídio.
Renan minimiza
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) minimizou os problemas de relação com Cunha, ampliados a partir da apresentação na segunda (10) da chamada Agenda Brasil. Para Renan, as instituições devem ficar em primeiro lugar. "Evidente que pode haver diferença pessoal entre os presidentes da Câmara e do Senado. O que não pode haver e não haverá e o Brasil não permite é a diferença das instituições", disse.
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